A literatura sempre foi um espelho da sociedade, refletindo seus valores, desafios e transformações ao longo do tempo. No Brasil, a figura feminina percorreu um longo caminho para conquistar espaço e voz, tanto na realidade quanto na ficção. Durante séculos, as mulheres foram retratadas sob a ótica dos escritores homens, que, com suas próprias visões e limitações, criaram personagens femininas que ora seguiam estereótipos, ora rompiam com eles.
Na semana do Dia Internacional da Mulher, quero destacar três personagens marcantes da literatura brasileira. Cada uma, à sua maneira, desafiou normas, conquistou leitores e deixou sua marca na construção da identidade feminina na ficção.
O silêncio imposto às mulheres ao longo da história moldou a sociedade brasileira e o caminho até onde estamos hoje. Posso falar e sou ouvida, mas muitas ainda precisam gritar para conquistar esse direito.
Nem sempre foi assim. Nossas antecessoras falavam pouco e, quando o faziam, era em sussurros, sem saber se seriam ouvidas. Precisavam medir cada palavra, pois poderiam ser mal interpretadas ou censuradas pelos fiscais dos bons modos.
Mesmo diante dessas barreiras, as mulheres sempre tiveram um impacto profundo na literatura brasileira, seja como autoras que lutaram para publicar suas obras em uma sociedade pouco tolerante, seja como personagens que desafiavam normas e abriam espaço para novas representações femininas.
Curiosamente, muitas dessas personagens foram criadas por homens, que, com suas próprias visões e limitações, deram voz a mulheres fictícias que, de alguma forma, refletiam e desafiavam a realidade de sua época.
Nesta semana em que celebramos o Dia Internacional da Mulher, quero prestar homenagem a algumas das protagonistas que marcaram a literatura brasileira e, de certa forma, pavimentaram o caminho que seguimos hoje.
Dom Casmurro, de Machado de Assis
Capitu é um dos maiores enigmas da literatura brasileira. Foi apresentada ao mundo pelas palavras de seu marido ciumento, Bentinho, em «Dom Casmurro». Com seus olhos ciganos, oblíquos e dissimulados, ela se tornou um mistério inesquecível:
“Capitu era Capitu, ou seja, uma criatura muito particular, ela era mais mulher do que eu homem.”
Mais do que uma personagem, Capitu simboliza a complexidade feminina e a maneira como a sociedade interpreta – ou julga – as mulheres ao longo da história.
Memórias de Emília, de Monteiro Lobato
Dos livros infantis, surge Emília, a irreverente boneca de pano do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Monteiro Lobato criou uma filósofa sagaz, de visão crítica e um humor ácido que marcou gerações:
“A vida da gente neste mundo, senhor sabugo, é isso. Um rosário de piscadas. Cada pisco é um dia. Pisca e mama. Pisca e anda. Pisca e brinca. Pisca e estuda. Pisca e ama. Pisca e cria filhos. Pisca e geme os reumatismos. Por fim, pisca pela última vez e morre.”
Com sua personalidade forte e perspicaz, Emília transcendeu as páginas e influenciou crianças e adultos, tornando-se uma das personagens femininas mais icônicas da literatura nacional.
Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa
Fechando essa lista com chave de ouro, temos Diadorim, peça central do romance «Grande Sertão: Veredas». Durante quase toda a narrativa, Diadorim se apresenta como um homem, desafiando padrões e confundindo o protagonista Riobaldo:
“Amor vem de amor. Digo. Em Diadorim, penso também – mas Diadorim é a minha neblina…”
Somente no final do livro é revelado que Diadorim era, na verdade, uma mulher. Guimarães Rosa construiu uma personagem que representa ambiguidades, paradoxos e a complexidade da identidade humana.
Essas personagens, tão diferentes entre si, mostram a diversidade e a força das mulheres na literatura brasileira. Se tiver a oportunidade, leia essas obras – em português ou até mesmo em outro idioma. Além de praticar o idioma, você conhecerá figuras essenciais para entender a formação da sociedade brasileira.
Soy Cássia, profesora de portugués de Brasil. He creado la Comunidad Tagarelar con el objetivo de que todos puedan aprender portugués desde cualquier parte del mundo, adaptando sus horarios de estudio a sus posibilidades.
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